domingo, maio 07, 2006

Sexo e... um ovo?

Estou relendo, depois de ter visto o filme, o livro O carteiro e o poeta. Em primeiro lugar, sim, vale a pena. Muito. Tanto o livro como o filme. Mas o que quero dizer é que existe um trecho, que descreve uma cena de amor entre Beatriz González e Mario Jimenez, que deve entrar para a história como uma das mais bonitas narrativas de sexo. Com um ovo como coadjuvante!

Faço questão de publicar aqui. O autor de Ardiente paciencia, o título em espanhol, é Antonio Skármeta. A tradução é de Beatriz Sidou.

Soltando a jarra de vinho e o avental, a menina recolheu um ovo do balcão e foi andando descalça debaixo das luzes dessa noite estrelada até o encontro.

Ao abrir a porta do galpão, soube distinguir por entre as confusas redes o carteiro sentado sobre um banquinho de sapateiro, o rosto colorido pela luz laranja de uma lamparina de querosene. Por sua vez, Mario pôde identificar, convocando a mesma emoção de antes, a precisa minissaia e a apertada blusa daquele primeiro encontro junto à mesa de totó. Como se combinando com a recordação, a garota alçou o oval e frágil ovo e, depois de fechar a porta com um pé, colocou-o perto de seus lábios. Abaixando-o um pouco até seus seios, fê-lo deslizar seguindo o palpitante vulto com os dedos dançarinos, resvalou sobre seu estômago liso, trouxe-o até o ventre, escorreu sobre seu sexo em meio ao triângulo de suas pernas, esquentando-o instantaneamente, e, então, cravou um olhar quente nos olhos de Mario. Este fez uma tentativa para levantar-se, mas a garota o conteve com um gesto. Colocou o ovo sobre a testa, passou-o sobre a superfície acobreada, montou-o sobre o tabique do nariz e, ao chegar nos lábios, enfiou-o na boca, firmando entre os dentes.

Mario, nesse mesmo instante, soube que a ereção sustentada com tanta fidelidade durante meses era uma pequena colina em comparação com a cordilheira que emergia de seu púbis, com o vulcão de uma nada metafórica lava que começava a desenfrear seu sangue, a turvar seu olhar, a transformar até sua saliva em uma espécie de esperma. Beatriz indicou-lhe que se ajoelhasse. Embora o piso fosse de madeira tosca, pareceu-lhe um tapete principesco quando a garota quase levitou até ele e se pôs ao seu lado.

Um gesto de suas mãos ilustrou que ele teria de pôr as suas em forma de cestinha. Se alguma vez obedecer lhe havia parecido intragável, agora só desejava a escravidão. A garota se curvou para trás e o ovo, ínfimo equilibrista, percorreu cada centímetro do pano de sua blusa e da saia até se deixar apanhar pelas mãos de Mario. Levantou os olhos para Beatriz e viu sua língua transformada em labareda entre os dentes, os olhos pertubadoramente decididos, as sobrancelhas na espreita, esperando a iniciativa do rapaz. Mario delicadamente levantou o ovo, como se estivesse a ponto de incubar. Colocou-o sobre o ventre da garota e, com um sorriso de prestigiador, o fez patinar em suas ancas, marcou com ele preguiçosamente a linha das nádegas, enquanto Beatriz, com a boca entreaberta, continuava com o ventre e as cadeiras em pulsações. Quando o ovo completou sua órbita, o jovem o retornou ao arco do ventre, fez a curva nas aberturas dos seios e, levantando-se com ele, infiltou-o pelo pescoço. Beatriz abaixou o queixo e o reteve ali com um sorriso que era mais uma ordem que uma gentileza. E, então, Mario adiantou a boca até o ovo, prendeu-o entre os dentes e, distanciando-se, esperou que ela viesse resgatá-lo de seus lábios com sua própria boca. Ao sentir a carne dela roçar por cima da casca, sua boca deixou que a delícia transbordasse por ele. O primeiro pedaço de pele que ungia era aquele que em seu sonho ela cedia como último bastião de um assédio que era contemplado agora com o lamber a cada um de seus poros, o mais tênue cabelinho de seus braços, a sedosa queda de suas pálpebras, o vertiginoso declive de seu pescoço. Era o tempo da colheita, o amor havia amadurecido espesso e duro em seu esqueleto, as palavras voltavam a suas raízes. Neste momento, pensou ele, este, este momento, este este este este este momento, este este, este momento este. Cerrou os olhos quando ela tirava o ovo com sua boca. Às escuras, cobriu-a pelas costas enquanto em sua mente uma explosão de peixes cintilantes brotava num oceano calmo. Uma imensa luz o banhava e ele teve a verteza de compreender, com sua saliva sobre esta nuca, o que era o infinito. Chegou até o outro flanco de sua amada e mais uma vez prendeu o ovo entre os dentes. E agora, como se ambos estivessem bailando ao compasso de uma música secreta, ela entreabriu o decote de sua blusa e Mario fez o ovo resvalar entre suas tetas. Beatriz desprendeu o cinto, lavantou a asfixiante prenda e o ovo foi arrebentar no chão, enquanto a menina tirou a blusa por cima da cabeça e expôs o dorso dourado pela lâmpada de querosene. Mario abaixou sua apertada minissaia e quando a fragrante vegetação de sua boceta acariciou seu nariz indagador, não teve outra inspiração senão untá-la com a ponta de sua língua. Neste exato momento Beatriz emitiu um nutrido grito de alento, de soluço, de dissipação, de garganta, de música, de febre, que se prolongou por alguns segundos em que seu corpo inteiro tremeu até se desvanecer. Deixou-se resvalar até a madeira do chão, e depois de colocar um dedo de sigilo sobre o lábio que a havia lambido, trouxe-o úmido até o tecido rústico da calça do garoto e, apalpando a grossura de seu pau, disse com voz rouca:

- Você acabou comigo, seu bobo.

4 Comments:

Anonymous Anônimo said...

...

Estou completamente sem palavras.

E acho que hoje vai ser um dia, digamos, "difícil" depois de ter lido esse texto e dar-me conta de que moro aqui.

Tenho o livro comigo. Vou me entregar a ele.

Besitos
Nena

18:47  
Blogger Gabriel Toueg said...

Um adendo, depois de um papo sobre esse texto do Skármeta...

O termo "acabar", além do significado em português, tem em espanhol um uso diferente. Por acaso, em hebraico é o mesmo. "Acabar" é gozar. Dizer em espanhol "me acabé" é como dizer em português "gozei".

Talvez seja apenas uma viagem minha, mas como o original é em espanhol, pode ser que esse seja o significado - que a tradutora tenha perdido pelo caminho.

Quem sabe, afinal?

15:12  
Anonymous Anônimo said...

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16:54  
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